terça-feira, 28 de abril de 2009

Ilha solteira

2550654053_ceb89c66cc_o

Outro dia li no blog da Bia sobre a medida tomada em Ilha Solteira sobre o horário em que adolescentes devem correr das ruas, sob pena de recolhimento caso não o façam. Primeiro pensei em comentar sobre o autoritarismo da medida ilhense, cheguei a fazê-lo. Depois, quando li a matéria, mudei de idéia. Tem aí uma discussão diferente. O que é da esfera privada e o que é público. Geralmente entendemos que esta responsabilidade cabe aos pais, mas uma parte dos ilhenses, por alguma razão, a passou para o Estado. Se desresponsabilizaram de parte do trabalho que lhes cabe.

A criança ou adolescente em risco deve ser protegida, antes de tudo, por aqueles que detem sua guarda. Caso os pais considerem que a presença de seus filhos na rua, a partir de determinado horário, seja nociva, devem impedi-los de sair. É assim na lógica de direitos e liberdades individuais que geralmente adotamos na criação de nossas crianças. Esta é a logica que imperou no caso dos pais que decidiram educar seus filhos em casa. Revoltaram-se com o processo movido contra eles, e receberam apoio de parte da mídia, entendendo que a educação de crianças está na esfera privada, longe da possibilidade de ação do Estado. Estavam legalmente enganados, neste caso o direito diz que os pais não podem fazer o que bem entendem da educação escolar de seus filhos, a sociedade representada tem soberania. A “melhor” argumentação destes pais era que seus filhos sabiam tudo para passar no vestibular, prova educacionalmente condenada. “Veja bem, meu filho é bom no que só atrapalha, então me deixem em paz”.

Há o caso dos pais que preferiam deixar o filho morrer à permitir uma tranfusão de sangue. Questão religiosa em conflito direto com o direito a vida. Decisão privada ou pública? O direito a liberdade religiosa ou a vida , ambos garantias individuais? Voltando ao caso de Ilha Solteira, o juiz argumentou que o toque serve para “proteger o cidadão que está com seu intelecto e moral em desenvolvimento”, então temos segurança versus liberdade, direito individual e coletivo. É uma mistura de responsabilidade privada e pública.  Se adolescentes compram bebida alcoólica em bares pela madrugada os pais os proibem de sair, o Estado prende que vende a bebida a menores e tudo se acerta, sem portaria alguma. Vamos colocar nossos jovens em situação comparável  a história “Eu robô”, em que, para proteção da humanidade, o cérebro positrônico (a palavra computador ainda não fazia parte do vocabulário) resolve prender todas as pessoas e criá-las em cativeiro. O argumento da segurança está, aos poucos, ferindo direitos individuais.

Certa vez alguns pais vieram me reclamar que a escola não tomava providências em relação aos seus filhos que, após o termino das aulas, iam para um bar. Novidade para mim, não para eles. Bastava que dessem um telefonema para o Disque denúncia, mas não o fizeram. O dono do bar seria preso e seus filhos estariam seguros.

Um ano e meio morando na China, país com mais de um bilhão de habitantes, não foi o suficiente para que meus pais vissem muitas crianças chinesas. Ao menos não durante a semana. Não há toque de recolher, os pequenos estão na escola. Muitos só vão para casa sexta-feira. Culturalmente entendem a educação como coisa pública, para a sociedade.

Uma dúvida ficou. O judiciário age quando cutucado, somente assim. Como um juiz entrou nesta história?

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Preso no tempo


Relógio (Clock) - Paris, upload feito originalmente por Japa Back to Floripa!!!.

Ê coisa difícil. Falta tempo pra vida na medida inversa em que faço mais coisas. O tempo falta por que faço mais coisas. Otimizo e ainda assim me falta. Faço mais e ele fica menos, não dá pra ser assim.

...

Em sala de sete e meia as dezoito horas. Meia hora de almoço. No tempo livre correção. Fiz tudo e no fim, não fiz. Precisava de mais tempo, arrumar mala, limpar o quarto que ficou sujo de obra, comer, descansar e simplesmente ficar a toa. O tempo é assim, a gente aperta e continua não cabendo.

...

O tempo do ócio. O ócio que é ócio, em contraposição ao ócio produtivo capitalista. Ócio livre, relaxado e sem compromisso. Ócio por direito, ou mesmo invertido, sem direito algum.

terça-feira, 21 de abril de 2009

O maníaco da faca


All men are bastard knife-block, upload feito originalmente por endraum.

Outra madrugada dessas, vindo do trabalho, Tico (nome fictício usado para preservar a identidade da vítima) foi esfaqueado. Desceu do ônibus como sempre fez, foi para casa como nunca. O esfaqueador estava no ponto, esperando alguém. Atacou, machucou e fugiu. A vítima reagiu, talvez tenha sido mais difícil que supunha o maluco.
...
Atendido no Hospital Universitário Antônio Pedro, Tico não corre mais risco de vida. O hospital estava em greve, abriu uma excessão naquela noite. O atendimento continuou em rede particular, com ameaças de processo contra o plano de saúde, que negava a necessidade de atendimento.
...
Nesta madrugada, no mesmo ponto de ônibus, o maníaco foi preso. Estava lá, aguardando mais uma vítima. Com ele estavam a arma utilizada nos ataques, um canivete e uma camisa extra. Reconhecido por Tico na mesma madrugada, responderá a processo por tentativa de homicídio.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

O Heavy Metal do Senhor

Senhor metaleiro. Mais, derrubando o Diabo das paradas. Uma cruzada musical, com armas iguais.

...

Séculos atrás foram espadas e o Diabo estava com os muçulmanos, mentirosos, enganadores, infiéis e indignos, segundo uma lógica valorativa meio doida inventada pelos cristãos. Engraçado é que muçulmanos não entendiam nada disso, só viam gente doida, saindo de longe por uma terra argumentando que era coisa de Deus. Hoje em dia os muçulmanos voltaram a fazer parte do "eixo do mau" no imaginário ocidental.

...

Disputaram minha alma outro dia desses. Não foram evangélicos, mas o pessoal da Johrei. Não nego que acho bom gente querendo o bem de outras pessoas. Ganhei um ikebana, repassei-o para alguém que acredito mais estressada do que eu sou.

...

Pensaram em criar uma delegacia para crimes religiosos, alguma coisa para investigar atos discriminatórios nesta disputa pelas almas dos seres viventes. Algo a ver com as insistentes quebradeiras de centros espíritas promovidas por evangélicos (sem generalizar) no Rio de Janeiro.

...

Outro dia, em coversa boa, lembrei da cruzada marxista pela alma proletária. Como foi acreditar que bastava mostrar a "verdade" sobre o mundo àqueles incultos trabalhadores para que, unidos, derrotassem os mentirosos, ardilosos, indígnos burgueses.

Divina Comédia




Inferno

Logo que chegou a porta do inferno, Dante deparou-se com enorme fila. Seu guia, Saramago, alertou-o que as filas são comuns no reino da infelicidade eterna. Esta primeira, era para marcar data em que deveria comparecer à repartição responsável por emitir documentação exigida pelos porteiros ifernais. O guia de nosso heroi explicou – Quatro são os documentos que deverás carregar por todo o tempo em que estiveres no inferno: primeiro deverás provar que chegastes a este mundo, com data, hora e o nome daqueles que te trouxeram, além, é claro, de testemunhas que comprovem a veracidade de tua chegada; segundo, terás que dizer a todos quem tu és, logo, te darão uma identidade em papel, com teu nome e um dos dedos, será seu primeiro número; terceiro, e logo depois, entrarás na fila para saberem que tu existes como devedor do Leviatã, pagador de todas as taxas impostas para garantir a continuidade de serviços deste inferno; por último, mas não menos importante, precisarás registrar tudo o que fizer como ofício, então tens de ter um documento para seus trabalhos, sem isto não sairás do limbo. Ainda será bom se portares papel dado pelos representantes de Deus, para que fique sempre claro que sabias por que leis seria julgado – Assim, tão obrigado quanto foi sua estada no inferno, Dante apresentou-se aos funcionários responsáveis e retirou a documentação nescessária. Tudo passou rápido, Dante entrava como convidado compulsório, não esperou em filas e foi diretamente atendido. Claramente, ver Dante passar a frente fazia parte do inferno de outros.

“Vai-se por mim à cidade dolente,

vai-se por mim a sempiterna dor,

vai-se por mim entre a perdida gente.

Moveu justiça o meu alto feitor,

fez-me a divina Potestade, mais

o supremo Saber e o primo Amor.

Antes de mim não foi criado mais

nada senão eterno, e eterna eu duro.

Deixai toda esperança, ó vós que entrais.”

Imagem de A Porta do Inferno, por Auguste Rodin, inspirada na obra de Dante. Inscrição neste mesmo portão, por Dante.

domingo, 12 de abril de 2009

O que seria se não fosse

Imposs101

Retornei.

Minha idéia era fazer isso com assunto novo, mas o jornal deste domingo não permitiu. Como sempre fui folheando a mídia, lendo o que me interessa e pulando aquilo em que não enxergo relevância. Li sobre a proposta que deve acabar comos vestibulares. Coisa boa, nada mais de jovens no vestíbulo estressante para a educação universitária. Nâo vai acabar com a seleção (a oferta aina é menor que a procura), mas talvez com o sofrimento e, assim espero, libertar o ensino médio da lógica “isso cai no vestibular” que coloca o objetivo de anos de estudo em uma prova que deixará de fora a maioria dos estudantes.

Seguindo adiante no jornal reencontrei o assunto favela. Dessa vez falava-se sobre  remoção. Era uma tentativa de melhorar a imagem que esta atividade tem. Ok, opinião do jornal O Globo. A matéria veio estampada com foto grande mostrando o que seria a favela da Catacumba (Lagoa) caso não houvesse a remoção. “O que seria se não fosse” deveria ser o título do texto escrito por quiromantes e sustentado por estudos de astrológos de instituições famosas. A afirmação é enfática, não há um “se” ou “talvez” escrito, colocando o dito no campo das possibilidades do que não é. No lugar de astrólogos aparecem engenheiros e seus estudos racionais (desde quando é racional afirmar o “se”).

Anteriormente postei sobre o défcit habitacional do Rio de Janeiro,capital. Obviamente, como a população continuou a crescer e as pessoas querem morar, a expansão das favelas não parou. A remoção “salvou” a paisagem da Lagoa, impedindo a imagem da pobreza nos morros em seu entorno,enquanto o resto da cidade as via cada vez mais presentes. Difícil ignorar sua presença, as favelas estão aí, com ou sem remoção, urbanismo ou qualquer iniciativa estatal já tentada.

Não entendi ainda onde querem colocar os brasileiros pobres, mas parece que é bem longe e cercados por muros. Não pode ser campo, afinal, assentar pobre em área rural é coisa de MST.

quinta-feira, 9 de abril de 2009


Infelizmente, problemas técnicos me impedem de atualizar o Então Sebastião durante esta semana. Espero que logo esteja tudo resolvido.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Ainda os muros

condominio

Comuns em cidades medievais, os muros protegiam moradores contra ameaças externas em um mundo em que a violência era grande. Guardavam pessoas em quantidades de 5 a dez mil, com algumas exceções, no espaço de algum senhor.

Comuns em cidades contemporâneas, os muros protegem os espaços privados contra ameaças externas e olhares curiosos. Guardam quantidades imensas de pessoas, as vezes mais de um milhão, e colocam limites ao que é público.

...

Niterói é uma cidade atípica em seu estado e no Brasil. Está entre as melhores qualidades de vida do país e possui parte considerável de sua população enquadrada no que chamamos de classe média.

Como em muitas cidades, os muros estão presentes. Nem sempre separam o privado do público. Construídos ao redor de casas, sim, mas também feitos cercando quarteirões, ruas e tudo o mais que estiver dentro de seu perímetro. São condomínios tranformando em privado o que é do público, impedindo o acesso à ruas e praças. Apropriação indébita em nome da segurança de quem pode pagar por terra.

O público tem preço. Depois de anos de ocupação, os condomínios receberam proposta para comprar o que foi ocupado. Ao que parece a atual administração não tocou mais no assunto e também esqueceu do que foi tomado ao povo. O Ministério Público lembra.